Gratuidade em ação de alimentos não exige prova de insuficiência financeira do responsável legal
Nas ações de alimentos em favor de criança ou adolescente, não se pode condicionar a concessão de gratuidade de justiça à demonstração de insuficiência de recursos do representante legal, tendo em vista que o direito à gratuidade tem natureza personalíssima (artigo 99, parágrafo 6º, do Código de Processo Civil de 2015) e que é notória a incapacidade econômica dos menores.
Entretanto, nos termos do parágrafo 2º do artigo 99 do CPC, é garantida ao réu a possibilidade de demonstrar a eventual ausência dos pressupostos legais para a concessão da gratuidade.
O entendimento foi fixado pela Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) ao reformar decisão que indeferiu pedido de gratuidade sob o fundamento de que não foi comprovada a impossibilidade financeira da representante legal dos menores, a qual exerce atividade remunerada.
Para o colegiado, a concessão da gratuidade em razão da condição de menor – mas com a possibilidade de posterior impugnação do benefício – atende ao princípio da inafastabilidade da jurisdição e respeita o exercício do contraditório.
“Essa forma de encadeamento dos atos processuais privilegia, a um só tempo, o princípio da inafastabilidade da jurisdição – pois não impede o imediato ajuizamento da ação e a prática de atos processuais eventualmente indispensáveis à tutela do direito vindicado – e também o princípio do contraditório – pois permite ao réu que produza prova, ainda que indiciária, de que não se trata de hipótese de concessão do benefício”, afirmou a relatora do recurso especial, ministra Nancy Andrighi.
Direito pessoal
Em cumprimento de sentença de alimentos, o juiz indeferiu o benefício da justiça gratuita por entender que não foi comprovada a impossibilidade financeira da representante legal dos menores. A decisão foi mantida em segundo grau. O tribunal concluiu que a condição de menor não faz presumir a impossibilidade de custear o processo, já que a genitora também é responsável financeira pelos menores e exercia atividade remunerada.
No recurso ao STJ, a mãe alegou que a concessão da gratuidade deve ser examinada sob a perspectiva dos menores, que são as partes no cumprimento de sentença, e não de sua representante legal. Segundo ela, o próprio atraso no pagamento da pensão alimentícia leva à presunção de insuficiência de recursos.
A ministra Nancy Andrighi apontou que, como previsto no artigo 99, parágrafo 6º, do CPC, o direito à gratuidade de justiça é pessoal, não se estendendo a litisconsorte ou a sucessor do beneficiário. Nesse sentido, ponderou a relatora, a concessão do benefício depende do preenchimento dos requisitos pela própria parte, e não pelo seu representante legal.
“É evidente que, em se tratando de menores representados pelos seus pais, haverá sempre um forte vínculo entre a situação desses dois diferentes sujeitos de direitos e obrigações, sobretudo em razão da incapacidade civil e econômica do próprio menor, o que não significa dizer, todavia, que se deva automaticamente examinar o direito à gratuidade a que poderia fazer jus o menor à luz da situação financeira de seus pais”, observou a ministra.
Presunção de hipossuficiência
No entanto, Nancy Andrighi lembrou que os parágrafos 2º e 3º do mesmo artigo 99 do CPC estabelecem que se presume verdadeira a alegação de insuficiência apresentada por pessoa natural e que o juiz só poderá indeferir o pedido de gratuidade se houver nos autos elementos que evidenciem falta dos requisitos legais para o benefício.
Para a relatora, no caso de gratuidade de justiça pedida por menor, a melhor solução é que, inicialmente, haja o deferimento do benefício em razão da presunção de insuficiência de recursos alegada na ação, ressalvando-se, contudo, a possibilidade de que o réu demonstre, posteriormente, a ausência dos pressupostos legais que justificariam o benefício concedido.
Queda de padrão
Segundo Nancy Andrighi, o fato de a representante legal dos autores possuir atividade remunerada e o elevado valor da obrigação alimentar objeto da execução não poderiam, por si só, servir de impedimento à concessão da gratuidade aos menores credores dos alimentos.
Conforme indicado nos autos, a relatora destacou que o pai das crianças não tem pago nada a título de alimentos desde 2016, o que implica redução do padrão de vida da família, privação de determinados bens e realocações orçamentárias que se mostram compatíveis com a declaração de insuficiência momentânea de recursos.
“Diante do evidente comprometimento da qualidade de vida dos menores em decorrência do sucessivo inadimplemento das obrigações alimentares pelo genitor, geradoras de cenário tão grave, urgente e de risco iminente, não é minimamente razoável o indeferimento do benefício da gratuidade da justiça aos menores credores dos alimentos, ressalvada, uma vez mais, a possibilidade de impugnação posterior do devedor quanto ao ponto”, concluiu a ministra ao deferir a gratuidade para os menores.
O número deste processo não é divulgado em razão de segredo judicial.
Fonte: http://www.stj.jus.br/sites/portalp/Paginas/Comunicacao/Noticias/Gratuidade-em-acao-de-alimentos-nao-exige-prova-de-insuficiencia-financeira-do-responsavel-legal.aspx
- Date - 12 de fevereiro de 2020
- Author - Ricardo
TRT-8: Condenação em sucumbência ao beneficiário de justiça gratuita é inconstitucional
O pleno do TRT da 8ª região declarou a inconstitucionalidade da condenação de honorários advocatícios ao beneficiário da justiça gratuita. O colegiado invalidou artigo trazido pela reforma trabalhista sob a justificativa de que o dispositivo causa obstáculo para aqueles que realmente precisam da Justiça do Trabalho.
Reforma trabalhista
O artigo discutido é o 791-A da CLT, incluído pela reforma trabalhista. Ele dispõe o seguinte:
“Art. 791-A. Ao advogado, ainda que atue em causa própria, serão devidos honorários de sucumbência, fixados entre o mínimo de 5% (cinco por cento) e o máximo de 15% (quinze por cento) sobre o valor que resultar da liquidação da sentença, do proveito econômico obtido ou, não sendo possível mensurá-lo, sobre o valor atualizado da causa.”
No entendimento dos desembargadores, o artigo viola os princípios e garantias fundamentais consagrados pela CF, tais como o princípio da dignidade da pessoa humana; princípio da igualdade; garantia fundamental da assistência jurídica integral e gratuita e princípio de amplo acesso à jurisdição.
Relator, o desembargador Gabriel Velloso Filho, afirmou que algumas medidas aprovadas pela reforma trabalhista violaram profundamente o direito do trabalhador, causando obstáculo ao acesso à Justiça.
“Nós hoje temos dois anos de promulgação da reforma trabalhista e o Tribunal decidiu tirar esse dispositivo da ordem jurídica. Então, o Tribunal considerou que é inconstitucional e, portanto, aqueles que são beneficiários da justiça gratuita, que são necessitados, eles, assim como litigantes do processo civil, não precisam pagar honorários advocatícios. Eles estão isentos. Esse é um pleito antigo. É um pleito histórico. Nós esperamos que vá contribuir para aquelas pessoas que realmente precisam da Justiça do trabalho. Que elas não se sintam desestimuladas e com medo de ingressar na Justiça, sabendo que podem pedir um direito que eles reconhecem como seu e acabam saindo devendo muito mais do que pediram.”
- Processo: 0000944-91.2019.5.08.0000
Informações: TRT-8
Fonte: https://www.migalhas.com.br/quentes/320197/trt-8-condenacao-em-sucumbencia-ao-beneficiario-de-justica-gratuita-e-inconstitucional
- Date -
- Author - Ricardo
Google é condenado a desindexar de sua busca nome de policial absolvido
Um policial militar absolvido do crime de prevaricação ingressou com ação na justiça fluminense pleiteando seu direito ao esquecimento. Requereu, para tanto, que o buscador Google fosse condenado a desindexar seu nome das reportagens que, à época, noticiaram seu envolvimento no crime. Também requereu que os jornais Folha de S. Paulo e O Estado de S. Paulo fossem obrigados a retirar do ar as referidas reportagens. Pleiteou, ainda, dano moral.
Direito ao esquecimento é tema que tem sido debatido pela doutrina
Divulgação
A decisão consta de projeto de sentença publicado na última terça-feira (4/2) e homologada pelo 29º Juizado Especial Cível, Regional de Bangu, do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro.
As reportagens narram um episódio no qual o autor da ação, junto de mais nove policiais, participa da recepção de propina paga por traficantes. Posteriormente, o episódio resultou em ação penal na qual o policial foi acusado — e absolvido — do crime de prevaricação.
O pedido foi julgado parcialmente procedente: o Google foi condenado a desindexar o nome do policial do resultado de buscas da ferramente “Google Search”, sob pena de multa diária de R$ 200, limitada a R$ 10 mil. Mas os dois jornais não terão que retirar as reportagens do ar. Por fim, o pleito de dano moral também foi indeferido.
Para chegar a esse resultado, a decisão identificou uma colisão entre o direito fundamental à honra (do policial) e o direito à liberdade de imprensa (dos réus). No passo seguinte, constatou que a liberdade de expressão não é absoluta, valendo-se de precedente do STJ segundo o qual a existência de circunstâncias excepcionais pode impor limites a essa liberdade.
Também mencionou julgado do STF, segundo o qual a evolução cultural da sociedade “confere concretude a um ordenamento jurídico que, entre a memória — que é a conexão do presente com o passado — e a esperança — que é o vínculo do futuro com o presente —, fez clara opção pela segunda”.
Sem interesse público
Além disso, o julgado registra que existem “circunstâncias excepcionalíssimas em que é necessária a intervenção pontual do Poder Judiciário para fazer cessar o vínculo criado, nos bancos de dados dos provedores de busca, entre dados pessoais e resultados da busca, que não guardam relevância para interesse público à informação, seja pelo conteúdo eminentemente privado, seja pelo decurso do tempo”.
Razoável anonimato
Segundo a decisão, o direito ao esquecimento “não se trata de efetivamente apagar o passado, mas de permitir que a pessoa envolvida siga sua vida com razoável anonimato, não sendo o fato desabonador corriqueiramente rememorado e perenizado por sistemas automatizados de busca”.
Também tentou deixar claro que o acesso a informações continuaria assegurado, já que as reportagens continuarão no ar. Para encontrá-las, contudo, “a busca deverá conter critérios relativos a esse conteúdo, seja em conjunto com o nome da autora [do policial], seja de forma autônoma”.
0022314-41.2019.8.19.0204
FONTE: CONJUR
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- Author - Ricardo
“Lei anticrime” torna estelionato crime de ação condicionada e divide opiniões
A Lei 13.964 fez uma série de alterações no sistema de justiça criminal e da legislação penal. Apesar do foco das atenções ser a criação do “juiz das garantias”, a normativa aglutina outras mudanças que tem provocado polêmica como o aumento da pena máxima de 30 para 40 anos.
Uma dessas alterações polêmicas é a que trata o crime de estelionato. O delito passou de uma ação penal pública incondicionada — promovida por denúncia do Ministério Público — para ser uma ação penal pública condicionada à representação.
A nova lei mantém, contudo, o estelionato como uma ação penal pública incondicionada nos casos em que ele for praticado contra a administração pública de forma direta ou indireta, contra crianças e adolescentes, pessoas com deficiência mental ou maior de 70 anos de idade ou incapaz.
A ConJur ouviu especialistas na matéria. Alguns enxergam fatores positivos na mudança e outros acreditam que as alterações não cumprem com o espírito de uma lei que é apregoada como uma verdadeira revolução no combate ao crime.
Para o promotor de Justiça em Minas Gerais André Luis Melo, a mudança prejudica o combate ao estelionato pois esse delito é, por natureza, mais difícil de ser provado. “No cotidiano há mais golpes, estelionatos, porém há mais processos por furtos por serem mais fáceis de serem provados”, diz. Segundo ele, quem tem “tendência a cometer crimes e recebe ensino formal muda de furto para estelionato, não deixam de cometer crimes como se imagina”.
Para o criminalista Welington Arruda, a mudança parece irrazoável e descabida. “A polícia não poderá investigar delitos de estelionato sem que haja a formal representação da vítima, exatamente como ocorre hoje com delitos de injúria, por exemplo. Polícias judiciárias do Brasil inteiro investigam inúmeros casos de estelionato, que é um crime ardil, complexo e em muitos casos, inclusive, a vítima sequer sabe que foi vítima. Considerando que em várias situações a vítima não sabe nem que foi vítima, como esperar que esta represente formalmente pela investigação?”, argumenta.
O advogado Gustavo Polido, no entanto, enxerga pontos positivos na medida. “Com a inclusão do parágrafo quinto no artigo 171 do CP, temos que há demonstração de redução da intervenção estatal em algumas condutas que podem, a depender da vontade do particular (representação para fins penais), tornarem-se objeto de tutela estatal. Tal inclusão, a meu ver, representa evolução no sentido de tornar o estado menos paternalista, como já se dá em alguns países”, comenta.
A possível participação maior da vítima no processo também é encarada como um fator positivo pelo advogado Matheus Freitas. “Por experiência própria, em crimes de estelionato, quando a vítima me procura eu oriento que seja feita uma notícia crime para ajudar na elucidação do delito. Essa notícia crime nada mais é do uma peça inaugural relatando para a polícia ou para o Ministério Público a ocorrência do estelionato. Como o volume de infrações dessa natureza é muito grande, a demonstração, por parte do ofendido, no interesse de perseguir criminalmente o infrator é salutar pois ajuda a desafogar o judiciário”, argumenta.
Já para o criminalista Ângelo Carbone, a medida pode trazer problemas para a vítima que for denunciar o crime. “O problema de abrir uma representação como essa é que se o crime não for comprovado você pode responder por falsa acusação de crime acumulada com uma possível ação indenizatória”, diz.
Ele também cita a fraude com cartão de crédito como um dos crimes cujo combate pode ser atrapalhado pelas novas regras. “Esse crime é enquadrado como estelionato. O problema é que é muito difícil localizar quem cometeu esse delito. O fundamental aqui não é achar esse infrator, mas entrar com uma ação contra o banco para que ele restitua esse valor. Um banco que deixa que sejam instalados equipamentos de clonagem nos caixas eletrônicos não tomou os cuidados necessários”, explica.
“Como uma pessoa que leva um golpe de estelionato tem estrutura de fazer um procedimento criminal. Ele vai ter que contratar um advogado para ele abrir um inquérito. Acredito que o Estado está renunciando a uma obrigação. O estelionatário é um criminoso que muitas vezes escolhe as pessoas mais simples. Isso que muitas vezes o valor é baixo e o custo do advogado e da ação supera o do golpe. Isso não é justo. Essa lei não está bem estruturada e prejudica os mais humildes”, argumenta.
Fonte: ConJur
- Date - 6 de janeiro de 2020
- Author - Ricardo